Quando Johann Wolfgang von Goethe era jovem, encantou-se pelo movimento do Sturm und Drang que citei em meu post anterior (aqui). Sim, quando jovem, a tempestade e o ímpeto nos impelem, nos puxam, nos tiram de rumo e definem nosso prumo, tudo ao mesmo tempo! O movimento, assim como o jovem, desejava romper com aquele classicismo racional e simétrico, quase estéril. Goethe queria liberdade, e a emoção, parecia-lhe, era a maior fonte de liberdade. Alguns diriam que há liberdade em controlar as emoções, outros que apenas se é livre quando a entrega aos sentimentos é absoluta. Discordo de todos, neste meu pequeno texto opinativo: somos todos presos (esse é um tema que trato à exaustão em meu romance Um caco de telha).
"Trato meu pobre coração como se fosse uma criança doente: dou-lhe tudo o que pede".
O livro é escrito em forma epistolar - vemos apenas as cartas que o jovem Werther enviava ao amigo Wilhelm. Goethe, um dos mais famosos escritores do Sturm un Drang, e que viria a deixá-lo para fundar aquilo que conhecemos como o Classicismo de Weimar, se esbalda nessas cartas que parecem, de fato, escritas por ele, para alguém. Goethe depois sentiria até um pouco de vergonha da exposição excessiva que o sucesso do livro lhe trouxe, e das comparações com sua vida. Mas o que importa? Na escrita, tem de haver entrega, não é mesmo? Como um puro representante do Sturm und Drang, Goethe intercala, em momentos diversos, falas sobre a beleza da natureza, textos que demandam rompimento com a estrutura social clássica, dores de amor e de paixão, de impulso. De seu pathos, seu, autor, expresso nas cartas desesperadas que Werther escreve.
O jovem apaixona-se pela Charlotte (aqui, temo, Goethe foi cândido por demais - Charlotte era também o nome de uma mulher com quem o autor trocava confidências e correspondências e, dizem, era sua paixão proibida), noiva de outro. O jovem vê correspondência em olhares e trejeitos de Charlotte (mesmo ela se questiona, em algum momento, se o ama e se o não ama), mas a impossibilidade é impositiva. Quanto é interpretação de Werther, quanto é paixão correspondida? Goethe acertou em cheio - o fato é irrelevante, o que importa é a interpretação.
Em determinado momento, o jovem escreve para seu amigo que:
"(...) quando verifico que o nosso espírito só pode encontrar tranquilidade, quanto a certos pontos das nossas pesquisas, por meio de uma resignação povoada de sonhos, como um presidiário que adornasse de figuras multicoloridas e luminosas perspectivas as paredes da sua célula... tudo isso, Wilhelm, me faz emudecer. Concentro-me e encontro um mundo de pressentimentos e desejos obscuros e não de imagens nítidas e forças vivas."
Sim, Werther. Somos presidiários, adornamos nossas paredes com figuras. Metáfora perfeita. Era a morte das imagens nítidas do classicismo, o (não) entendimento do obscuro, do escondido! O texto acelera em um crescendo, enquanto as cartas tornam-se progressivamente mais aflitivas. Com o sofrimento de um amor puro e absoluto (clássico, diriam), o jovem decide que não há mais como viver. Tinha de matar, com o romantismo, esse eu-clássico.
O livro, rápido de se ler, gerou um "efeito Werther" à época, em que jovens cometiam suicídio ante amor não correspondido. Esse dado, em verdade, é anedótico e, parece, não confirmado. Mas é romântico e estético deixá-lo aqui, não lhes parece? E quem sou eu - e quem é você - para fugir à estética que o autor nos oferece, e que os leitores nos demandam?
Apaixonei-me pelo texto de Goethe. Seus poemas, que vim a ler depois, falam à alma. Este livro, porém, é sensacional, uma obra maravilhosa e importante. Recomendo sua leitura, uma viagem para dentro da alma atormentada de um jovem movimento, na pessoa de um artista desiludido.
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